Ingrid (o começo de um BG)

  A chuva cai enquanto molhando o cabelo e as roupas de Ingrid. Ela está cansada e já não sabe o que é suor e o que é água da chuva. As pernas dela doem, se fosse em outra circunstância ela teria desistido, mas não naquele momento.

Quando Ingrid viu Estevão no vilarejo havia pensado que era apenas mais um forasteiro. Restória não era exatamente um lugar que era destino de qualquer pessoa, no máximo o ponto de descanso de uma ou outra alma perdida. Com sorte estava no caminho de alguém. Talvez por isso os quartos do "Jumento Manco" a taverna e hospedaria da família de Ingrid andavam tão... empoeirados. Na verdade ultimamente os únicos hóspedes daqueles quartos eram as aranhas.

Dessa vez era diferente, Anton, o forasteiro que entrava naquela taverna disse que iria passar alguns dias lá. Ele estava indo para algumas festividades de sua família em uma cidade mais ao sul do vilarejo, porém não muito distante. Os longos dias de viagem estavam cobrando seu preço e ele precisaria de ao menos uma semana para poder renovar suas energias e não chegar tão cansado à terra de sua parentela.

Ao ouvir Anton, Ingrid foi correndo arrumar um dos quartos para receber o novo hóspede. Ela ainda não o tinha visto, mas mesmo sem conhecê-lo já achava que ele deveria ser muito exigente. Mal sabia ela que a forma de falar dele era por causa do cansaço.

Ao descer as escadas seu pai foi logo chamando ela. "Vai ajudar a sua mãe na cozinha, hoje a taverna deve se encher mais que o comum, sabe como esse povo fica quando chega alguém novo aqui." E Ingrid realmente sabia. Todo mundo queria saber tudo sobre qualquer "carne nova" da vila. Uns achavam que a pessoa poderia se tornar uma pretendente, outros achavam que ela seria uma ameaça. Tudo dependia do gênero da pessoa.

Sem demora Ingrid foi para a cozinha ajudar a deixar as comidas pré-prontas, para que não demorassem muito a ser preparadas. Depois disso ela foi para o salão, ela preparava as bebidas enquanto o pai entregava. Ele falava que era melhor a filha não ficar andando por aí no meio de um bando de "bêbados safados".

De trás do balcão ela não tinha muito tempo de observar os clientes, logo, ela ainda não tinha tido a oportunidade de ver o tal forasteiro. A noite foi avançando, a taverna foi se silenciando, seja pelos que finalmente foram embora ou aqueles que sempre acabavam dormindo nas mesa até o momento que sobraram apenas alguns rostos conhecidos e um desconhecido. "Deve ser o tal forasteiro... provavelmente mais um metidinho da cidade". Ele veio até o balcão e pediu orientação sobre onde ficava seu quarto, seu pai já havia levado as malas e pediu pra que ele buscasse a chave no balcão. Ela lhe indicou o quarto, entregou a chave. Ele agradeceu com um sorriso simpático. Ela não esperava isso dele.

Com o passar do tempo ela foi tendo mais oportunidades de conhecer ele. Como no momento em que ela estudava nas mesas do salão e ele veio ajudá-la. Em outros momentos ele ajudou na organização da taverna ("é melhor do que morrer de tédio" ele justificava). Ela via a forma como ele tratava os outros, sempre cordial e amável.

Ela não sabia, mas já estava se apaixonando. Sempre arranjava uma forma de falar dele nas conversas. Olhava pra ele quando ele não estava atento. Passou a não conseguir falar com ele sem ficar sem graça ou com medo de falar besteira, não tocava nele nem conseguia olhar direito em seus olhos com medo de parecer estranha. A confirmação da paixão veio depois que ele teve que ir embora. Mesmo sem vê-lo ela continuava a pensar nele, lembrava das conversas, dos seus jeitos. Via como se fossem ecos dele nos lugares em que ela costumava observá-lo. Mas não havia o que fazer, ele tinha que ir embora, precisava seguir seu caminho.

O tempo foi passando e os sentimentos dela não foram diminuindo, então um dia Gustavo, um dos moradores do vilarejo, voltou com notícias da cidade ao sul. Os minotauros em sua expansão haviam atacado a cidade e dominado. Algumas pessoas fugiram, outros foram feitos escravos e os mais nobres e guerreiros iriam ser executados em dois dias. A viagem a cavalo durava apenas um dia. Porém a pé demoraria mais tempo. Ingrid perguntou sobre Anton, Gustavo disse que ele havia resistido para ajudar outros a fugirem e estava entre os prisioneiros.

Ingrid não conseguiu pensar, ela saiu correndo apesar da chuva lá fora, muito tempo depois a adrenalina baixou, o cansaço e as dores bateram, mas ela não conseguia parar. Ela não podia deixar que ele morresse, ela não sabia o que iria fazer ao chegar lá, só sabia que teria que salvá-lo. Se perguntassem a ela há um tempo se ela seria capaz de enfrentar um grupo de minotauros por alguém, ela diria que não. Agora para ela não havia outra opção.

Enquanto corria pedia aos deuses que a ajudassem, que de alguma forma fosse possível ela salvar o amado. Foi então que finalmente ela encontrou um pequeno grupo que aparentemente de aventureiros composto de um samurai em armadura cerimonial escarlate, empunhando uma katana faiscante de relâmpagos; guerreiro humano de rosto severo, vestindo uma armadura completa, sem elmo carregando uma enorme espada mágica de duas mãos; uma jovem humana barda e esbelta com seu alaúde, uma maga exuberante de cabelo esverdeado e olhos brilhantes de cores variadas e uma dançarina sorridente e cheia de vida que parecia discutir com os demais falando que o que eles queriam fazer era desnecessário. Vendo Ingrid já esgotada física e emocionalmente, o grupo a acolheu e lhe perguntou o que acontecia, ela disse que não tinha tempo, precisava continuar, que os minotauros iriam executar o seu amor. O guerreiro virou para a dançarina que entendeu de súbito o seu papel ali e se ofereceu para ficar com Ingrid, que subitamente começou a se acalmar com a certeza de que tudo ficaria bem. Os demais foram à cidade resgatar Anton e mais alguns prisioneiros.

Ingrid não sabe como foi a batalha, a paz que sentiu em seu espírito depois de tanto nervosismo e correria fizeram com que ela dormisse profundamente. Quando acordou Anton estava a seu lado e os aventureiros tinham sumido. Eles já não estavam na mesma floresta que antes, Anton explicou que eles foram teletransportados pra lá, para ficarem em segurança longe da rota dos minotauros. Disse a Ingrid que sentia muita falta dela, porém não pode ir vê-la devido às obrigações que ele tinha que cumprir com a família. Ela estava tão feliz, olhando em seus olhos castanhos, sua pele alva... tudo o que ela soube fazer foi agradecer aos deuses por terem cuidado de seu amado. E deixou escapar de seus lábios um "eu te amo" enquanto o abraçava, ao perceber o que tinha dito ela tentou se afastar, porém ele a segurou mais forte e disse "eu também te amo".

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